15/10/07

Quem diz que é pela rainha

Olá a todos!

Convidamos-vos a ler o seguinte texto de uma canção interpretada por José Afonso .

Quem diz que é pela rainha*
* José Afonso, “Fura Fura”, MOVIEPLAY PORTUGUESA, SA, 1987

Letra: popular
Música: José Afonso

Quem diz que é pela rainha
Não precisa de mais nada
Embora roube à vontade
Ninguém lhe chama ladrão
Todos lhe apertam a mão
É homem de sociedade

Acima da pobre gente
Subiu quem tem bons padrinhos
De colarinhos gomados
Perfumando os ministérios
É dono dos homens sérios
Ninguém lhe vai aos costados

A letra, inevitavelmente, recorda-nos algumas situações que todos temos conhecimento, ou que, já “ouvimos falar”.


Recentemente, um professor de Marketing do Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa (ISCTE), veio afirmar a sua pretensão em criar um partido político (Manifesto, Mérito e Sociedade), no qual uma das medidas a implementar é a “despolitização da Administração Pública”.

Além da politização de vários sectores da sociedade, também acontecem situações no mínimo caricatas (para não chamarmos outra coisa), como a do BCP e a do filho do presidente do banco que, parece, viu “perdoada” uma dívida no singelo valor de 12 milhões de euros… E que agora o papai veio pagar... Há mais...

Sendo estas situações bem actuais, justificam que o primeiro contributo para o debate esteja centrado na canção aqui referida até porque, segundo consta, no nosso concelho também há por aí alguns que são todos pela rainha.

Gostávamos de saber a vossa opinião sobre o fenómeno retratado aqui pela canção interpretada pelo José Afonso.

Será que o espírito da intervenção política do 25 de Abril de 1974 já se perdeu de vez ou apenas está “diluído”?

Deixamos algumas sugestões de debate:

Porque é que será que a politização da administração pública é uma “instituição” já com tanto tempo de vida no nosso país?
A “ambição” do homem justifica que a política seja utilizada para alcançar outros fins que não o serviço público?
Afinal o que é que pretendemos do exercício da actividade política?

Jovens Saudações Socialistas
Secretariado da Juventude Socialista
Concelhia de Gouveia

3 comentários:

Ricardo Monteiro disse...

Bom parece-me que o espírito interventivo está cada vez mais diluído na nossa sociedade.
As pessoas vêm o país a decair, completamente a retroceder, mergulhando num precípio do qual ninguém parece querer sair, que só serve os interesses de um determinado grupo de senhores que vêem o país como o seu feudo onde podem fazer o que quiserem com absoluta vassalagem por parte dos governantes.
Penso que está na hora de acordar mas o povo português teima em não querer acordar e as imbecilidades, os roubos, os assaltos à inteligência continuam e não param eles não querem que pare!
E todos os dias observamos nas televisões, nas rádios e nas revistas, os senhores Pseudo Intelectuais, as tais "cabeças pensantes" do nosso País a terem verdadeiros orgasmos intelectuais, quando se ouvem pois sabem que com o seu discurso oco, vazio o Povo vai continuar a não ligar ao que se passa e a barbárie continuará...
Aproveito para transcrever um texto de Guerra Junqueiro que continua a ser muito actual.
"Um povo imbecilizado e resignado, humilde e macambúzio, fatalista e sonâmbulo, burro de carga, besta de nora, aguentando pauladas, sacos de vergonhas, feixes de misérias, sem uma rebelião, um mostrar de dentes, a energia dum coice, pois que nem já com as orelhas é capaz de sacudir as moscas; um povo em catalepsia ambulante, não se lembrando nem donde vem, nem onde está, nem para onde vai; um povo, enfim, que eu adoro, porque sofre e é bom, e guarda ainda na noite da sua inconsciência como que um lampejo misterioso da alma nacional, reflexo de astro em silêncio escuro de lagoa morta. [.]
Uma burguesia, cívica e politicamente corrupta até à medula, não descriminando já o bem do mal, sem palavras, sem vergonha, sem carácter, havendo homens que, honrados na vida íntima, descambam na vida pública em pantomineiros e sevandijas, capazes de toda a veniaga e toda a infâmia, da mentira a falsificação, da violência ao roubo, donde provem que na política portuguesa sucedam, entre a indiferença geral, escândalos monstruosos, absolutamente inverosímeis no Limoeiro.
Um poder legislativo, esfregão de cozinha do executivo; este criado de quarto do moderador; e este, finalmente, tornado absoluto pela abdicação unânime do País.
A justiça ao arbítrio da Política, torcendo-lhe a vara ao ponto de fazer dela saca-rolhas.
Dois partidos sem ideias, sem planos, sem convicções, incapazes, vivendo ambos do mesmo utilitarismo céptico e pervertido, análogos nas palavras, idênticos nos actos, iguais um ao outro como duas metades do mesmo zero, e não se malgando e fundindo, apesar disso, pela razão que alguém deu no parlamento, de não caberem todos duma vez na mesma sala de jantar."
in Guerra Junqueiro, "Pátria", 1896

PA disse...

Aquela ideologia do 25 de Abril "morreu" ali naquele dia. Na verdade com o passar destes anos percebemos claramente que em Portugal existe a velha máxima " Se não consegues vencê-los junta-te a eles!". Infelizmente é a sociedade que temos, e de certa forma as pessoas acomodam-se a isso de forma quase irreversível. A forma de fazer política é hoje sinónimo de proveito pessoal,claramente, hoje o político olha primeiro para o seu bolso e depois pro dos outros e o chamado serviço público fica para segundo plano. Mas o problema é que existe um desencadear de sucessivos "aconchegos" que quando um jovem chega á política mesmo que tenha ideias novas e vontades usa aquela máxima que citei em cima...não tem hipotese!
É preciso renovação, mas renovação à séria não é ,por exemplo, um político que esteve no governo dois anos antes e que esteve algo " escondido" e depois reaparece como que D. Sebastião que volta do nevoeiro de terras africanas.Culpa disto?! O lobby dos partidos políticos e a própria comunicação social que gosta de mexericos em vez de fazer serviço público.
E claro que não podíamos deixar de falar de "padrinhos", que insere-se bem na contextualização do tema em foco. Ele existe em todo o lado, é no emprego, é no centro de saúde, é no supermercado, eu sei lá, ele está em todo o lado. " epáh não arranjas um lugar para o meu miúdo na tua empresa?" ou "...vê-lá se me arranjas uma consulta mais próxima!só consegui para 2009..." E assim se vive. Toda a gente sabe, porque se tornou público, o caso do funcionário do Museu da Miniatura em Gouveia e o museu ainda está para inaugurar. Ele se calhar não é mau rapaz, é um entre muito em Gouveia que precisa de emprego mas pronto... a verdade é que, hoje, tudo se faz descaradamente!

Rúben Figueiredo disse...

Maria de Lurdes Pintasilgo disse uma vez que “falta cumprir o 25 de Abril”, corria os anos finais da década de 1990 ou inícios de 2000.
Ainda hoje, particularmente nos nossos dias, a ideia continua actual. Ela referia-se à pobreza existente, às desigualdades sociais, à falta de justiça social.
Em pleno século XXI o nosso país é o exemplo da falta de justiça social que existe na humanidade. Não é que existam países perfeitos, mas alguns conseguem alcançar de forma mais satisfatória alguns destes objectivos.
Há quem diga que a culpa é do excessivo protagonismo do Estado, outros dirão que o privado se envolve em demasia na “coisa pública” (particularmente quando os lucros potencialmente são elevados, como por exemplo saúde, segurança social…).
Na minha modesta opinião todos têm a sua parte de razão, embora gostasse de acrescentar mais uma ideia que raramente vejo debatida.
Qual é o papel que as gerações que protagonizaram o “25 de Abril” têm no estado actual do país?
Houve felizmente e sem equívocos uma melhoria qualitativa nas condições de vida da maioria dos portugueses. A Democracia em si é o seu melhor reflexo.
Mas, porque é que desde 1974 se têm “eternizado” nos diferentes lugares de chefia deste país os mesmos quadros? Isto quando são quadros formados, pois por vezes também nem qualificação específica têm…
Onde é que está a capacidade crítica eu caracterizou as gerações mais velhas do que a nossa? A geração rasca, à rasca para quem nasceu nela, teve a felicidade de aproveitar o acesso ao ensino e à formação que a Democracia trouxe.
Mas, a realidade é que se debate com problemas que supostamente a Revolução deveria ter ajudado a resolver.
Ficou célebre o artigo do Professor Cavaco Silva sobre “a boa e a má moeda”, mas foi a sua geração (e governos), que colocou todas as moedas no mesmo mealheiro, sem critérios que não os partidários (e isto é válido para todos os partidos políticos).
Além disto, a mentalidade tipicamente portuguesa, bem explícita nos dois comentários já aqui publicados, sustentam este estado de coisas.
A começar pelo “desenrascanço” que ou se utiliza ou não alcançamos uma “simples” consulta no médico especialista ou não alcançamos o emprego a que achamos que temos direito.
Se a nossa geração tem realmente espírito crítico, formação, tem o dever de intervir mais nos diversos sectores da sociedade e de “lutar” contra alguns “obstáculos” que existem nesse mesmo direito de intervenção.
Isto é válido num partido político, numa associação cultural ou no emprego. Seja na escala municipal ou nacional. Mas sobre isto teremos muito tempo de aprofundar alguns casos da nossa querida Gouveia…

Cordiais Saudações

Rúben Figueiredo